Sunday 26 February 2012

Metade

"Que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio...
Que a morte de tudo em que acredito não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito, a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe seja linda, ainda que triste.
Que a mulher que amo seja para sempre amada, mesmo que distante
Porque metade de mim é partida, a outra metade é saudade.

Que as palavras que falo não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor,
Apenas respeitadas.
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos.

Porque metade de mim é o que ouço, a outra metade é o que calo.
Que a minha vontade de ir embora se transforme na calma e paz que mereço
Que a tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que penso, a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste
E o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
Que o espelho reflicta o meu rosto num doce sorriso, que me lembro ter
dado na infância
Porque metade de mim é a lembrança do que fui, a outra metade não sei...

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria pra me fazer
inquietar o espírito
E que o seu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo, a outra metade é cansaço.
Que a arte me aponte uma resposta mesmo que ela mesma não saiba
E que ninguém a tente complicar, pois é preciso simplicidade pra
fazê-la florescer.

Porque metade de mim é plateia e a outra metade é uma canção.
Que a minha loucura seja perdoada,
porque metade de mim é amor...
e a outra metade também. "

Oswaldo Montenegro